sexta-feira, 28 de dezembro de 2007

Tempo rei

Não vejo como velho o ano que finda, nem tampouco como novo o que se anuncia. O tempo é fio contínuo, costurando a vida, bordando memórias.

E vamos todos “passando a régua” no ano que termina e caprichando no cabeçalho da agenda na qual imaginamos escrever a história dos nossos próximos 365 dias. Não importa a cultura – mesmo não coincidindo as datas –, toda a humanidade tem seu momento de zerar um ciclo para dar início a outro. Independentemente de nosso percebido sucesso ou fracasso, uma nova onda se ergue no mar de nossa vida para que tenhamos a oportunidade de surfá-la, agora sim, magistralmente. O momento “da virada” se apresenta como um hiato que abrimos no tempo. A última quinzena de dezembro passa por uma desaceleração progressiva até chegarmos ao “devagar-quase-parando” da semana pós-Natal. É como se repetíssemos anualmente um mesmo rito de passagem.

Talvez esse seja o momento no qual sentimos com maior intensidade a mão de Cronos sobre o nosso destino. Não devemos, porém, perder de perspectiva que seu reinado é absoluto, se imiscui em nosso cotidiano mais comezinho e rege a maneira como apreendemos nossa existência e como registramos nossa história. Sob essa ótica, o fator tempo passa a ser também um dos principais componentes na formulação das equações do planejamento das ações voltadas para comunicação do marketing.

Quantas vezes já fizemos estas perguntas ao “arredondamos” um briefing?

  1. Qual é o tempo do target ao qual nos dirigimos? Sim, porque as pessoas e as gerações têm tempos e maneiras de perceberem a dinâmica da existência diferenciadas. O tempo é relativo, seu “clock” será tão ou mais veloz quanto mais no passado estiver o referencial de quem o vive. Explicando: nos últimos sessenta anos a humanidade conheceu mais avanços tecnológicos do que em toda sua história. Para quem nasceu antes ou durante as primeiras décadas desse período, a sensação de que o tempo está acelerado será maior do que para quem é mais contemporâneo e não vê novidade onde seus pais se maravilharam. Ou seja, quanto mais jovem, mais lenta será a percepção de velocidade do tempo. Já ouvi de pessoas para quem, como eu, o videocassete foi uma novidade deslumbrante: “nem me familiarizei com o videocassete de duas cabeças e já estão aposentando o DVD!”. Aqui, o tempo é veloz ou “a jato” como se dizia quando essa era a referência mais empolgante de velocidade que se conhecia. Da mesma forma foi difícil para minha filha, então com 16 anos, entender que um dia o cinema e a TV tiveram a imagem em preto e branco: “como vocês assistiam isso?!”. Para ela e seus amigos o tempo não tem nada de veloz.

  1. Qual é o tempo do produto (ou serviço)? Celulares, players de Mp3, Mp4, GPS, HD-TV, Wii, e tantas outras novidades postas no mercado nos últimos cinco anos têm um tempo diferente do que carros, eletrodomésticos e que tais. Recentemente uma empresa produtora de processadores fez um grande esforço de marketing para dizer ao mercado que tinha o mais veloz processador. A reação do mercado? Completa apatia. A lei de Moore, que pregava com orgulho a duplicação da capacidade dos processadores a cada 18 meses, já não empolga mais ninguém: o tempo dos consumidores de processadores é outro, Moore foi assimilado como default.

  1. Qual é o tempo do mercado? Essa questão aqui está intimamente ligada à anterior. Há mercados velozes que passaram a viver a velocidade da atualização sem limites (o do universo digital, por exemplo) e outros que chegam a ser atemporais, como o de automóveis, no qual o tempo parece suspenso. Não fosse assim, o Gol da Volkswagen não seria o carro mais vendido no Brasil e o Mercedes Classe A – o carro com mais tecnologia embarcada e com melhor relação custo/benefício já fabricado em Pindorama –, não teria encerrado sua produção por falta de escala.

  1. Qual o tempo da marca? Na velocidade do mercado? À frente dele? Propositalmente mais lento? Nada é linear; há consumidores velozes que optam por marcas lentas (ou o inverso), dependendo do momento do consumo. Isso me faz lembrar um caso curioso no qual, em nome da velocidade do tempo, uma instituição de ensino de nome Imaculada Conceição optou por se transformar na sigla IMACO. Ora, a marca Imaculada Conceição tem um tempo todo seu, que está no ritmo de um canto gregoriano, longe do bate-estaca eletrônico de IMACO. Provavelmente os pais, mesmo os rapidinhos, quando procuram uma instituição de ensino devem buscar uma velocidade de valores e conceitos bem mais lenta.

Essas e outras questões, sob a égide do tempo, precisam ser levantadas porque estou certo de que constituem novos vetores da estrutura da realidade sobre a qual o planejamento promocional pretende agir. Portanto, junto com o tradicional adeus ao ano velho, vamos nos despedir para sempre da hora de 360 segundos. Pois se ainda sentimos isso como velocidade é porque não nos livramos de todo dos antigos referenciais. Mas isso, sem resistir ao trocadilho, é só uma questão de tempo.

Um comentário:

Anônimo disse...

vou emoldurar esse post! :)