Quando menino, assim que chegava da escola, livrava-me da armadura do uniforme (calça curta com pregas, meias “3/4”, sapato de couro e camisa branca abotoada até o colarinho), vestia apenas um arremedo de shorts e chispava para o playground que, na verdade, era “playstreet”, pois abrangia a área toda da rua em que eu morava.
Antes de ganhar o portão de casa, porém, ficava algum tempo na soleira da porta deliciando-me com a sensação refrescante do cimento frio e úmido em contato com meus pés assados no forno do sapato nas tantas horas passadas no colégio. Nunca esqueci desses momentos. Tempos mais tarde, percebi que aquele frescor era a anunciação da liberdade, o momento de poder viver eu mesmo e não aquele personagem que cedo e convincentemente passei a representar.
Ainda hoje, nas raríssimas vezes em que toco o solo cimentado com os pés nus, a sensação se repete como uma longínqua lembrança emocional que se manifesta fisicamente. É um caso de alta intensidade daquilo que chamamos de “brand experience”, com uma emoção no lugar do “brand”. Penso que isso é o que devemos perseguir nas ações promocionais nas quais buscamos associar a marca e seu conceito a uma experiência emocional, principalmente nos casos em que o diferencial com a concorrência é mínimo ou imperceptível e quando o conceito não é “tangibilizável” pela experimentação (sampling) do produto.
Um dos objetivos recorrentes no planejamento de campanhas de propaganda sempre foi o de buscar awareness para uma marca. Devido ao caráter eminentemente discursivo da propaganda, mesmo nas peças com forte approach emocional e extremamente envolventes, mantém-se uma relação narrador/espectador (ou leitor). Ou seja, mesmo fazendo sorrir, pensar, chorar (às vezes) ou surpreender, a propaganda segue os cânones da dramaturgia aristotélica, que busca a empatia e conduz à catarse através do enfeixamento de elementos que permitam ao receptor da mensagem visualizar e experimentar a sensação que se deseja provocar. É nesse ponto que, para se conquistar “awareness”, no sentido de conhecimento a partir da “consciência” de algo, é preciso que a ação de comunicação vá além de dar ciência emocional da existência de uma marca e seu conceito, surgindo aí a oportunidade de se desenhar ações para um programa de brand experience.
É evidente que boas campanhas de propaganda, mais do que levar apenas conhecimento, contribuem para que se construa também uma consciência da marca anunciada. Mas ganha-se muito mais eficácia se a “tool box” desenhada pelo planejamento puder contar com uma ou mais ferramentas de experiências não cognitivas, que façam as pessoas tocarem a laje com os pés descalços, antes de correrem para o abraço da vida. Ferramentas que estabeleçam uma comunicação não discursiva e não objetiva que se conectem diretamente à “porta USB” do banco de dados emocionais do cérebro.
Reconheço que a proposta traz toda sorte de dificuldades, sendo a maior delas seu caráter não imediatista num meio, como o marketing promocional, que vive de resultados de curtíssimo prazo.
Infelizmente, temos visto poucas iniciativas nesse sentido (alô, promo planners, corrijam-me se eu estiver errado), a maioria tendo por estratégia o uso de eventos proprietários.
Seguindo a linha provocativa de lançar desafios, inaugurada pela promo planner Roberta, vai aqui também o meu repto: como você planejaria uma ação de brand experience para um produto ou serviço de sua escolha que não estivesse travestida de patrocínio de um evento?
segunda-feira, 10 de dezembro de 2007
De brand a brain experience
por
Marinho
às
11:16
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