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sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Propagandísticas

Antes de começarem a ler o texto abaixo, escrito por Claudio Abramo, gostaria de esclarecer os motivos que me levaram a replicá-lo aqui:

1. Gerar reflexão e diálogo
2. Mostrar que a maneira irresponsável com que muitos profissionais encaram a publicidade ("Cocô na casa do Pedrinho") está tornando as pessoas cada vez mais críticas e transformando nossa profissão em alvo de escárnio.
3. O texto é ótimo. Boa leitura.

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Tomo a liberdade de comentar dois anúncios publicitários que estão sendo veiculados na televisão.

Antes, conviria esclarecer que, na opinião deste que escreve, publicidade é uma das coisas mais detestáveis que existem na face da terra.

1. A justificativa formal para a existência da publicidade é econômica. Vai mais ou menos assim:

Uma condição necessária para que os mercados (ou seja, os ambientes em que se dão as relações entre consumidores e fornecedores de produtos e serviços) funcionem é que os consumidores conheçam as diferentes opções que lhes são oferecidas pelos fornecedores.

Num ambiente em que a informação a respeito de bens e serviços não flua bem, a competição entre fornecedores é atenuada e a eficiência econômica resulta reduzida. Ou seja, não apenas os preços praticados são mais elevados do que poderiam ser como a redução da competição entre fornecedores não os estimula a reduzir custos via barateamento de processos produtivos, busca de melhores materiais, desenvolvimento de mecanismos auxiliares (como logística) mais eficazes, criação de novos produtos etc.

Portanto, a justificativa para a publicidade é informar os consumidores a respeito das características de bens e serviços disponíveis no mercado, de forma a permitir-lhes tomar decisões de compra racionais.

2. Esse é o pretexto formal, que os publicitários sempre mencionam (na forma de discursos sobre a “liberdade de informação”) quando enxergam alguma ameaça no horizonte (como, por exemplo, serem proibidos de emporcalhar a cidade com cartazes propagandísticos).

Qualquer pessoa que já tenha ligado um aparelho de televisão, ouvido o rádio, folheado uma revista ou jornal sabe perfeitamente bem que a última atitude que os publicitários e as empresas anunciantes desejam é que o consumidor tome decisões racionais. A publicidade é completamente voltada para apelos de natureza subjetiva (”emocional”, como costumam equivocadamente dizer os publicitários).

Assim, não há racionalidade que consiga explicar que alguém (por exemplo) decida adquirir um desses caminhões pretos com tração nas quatro rodas, motor diesel e ilegais vidros escurecidos (proibidos pelo Código Nacional de Trânsito mas nunca multados — DETRAN, cadê você?) para trafegar numa cidade. Os anúncios desses veículos puxam pela vida rural, exibem estradas centro-africanas e trilhas inexpugnáveis, como se o público consumidor desses troços conseguisse distinguir uma vaca de uma cabra.

Os publicitários devem ter total horror aos sítios de Internet que oferecem produtos de marcas diferentes com suas respectivas características e preços. Não há, ali, lugar para um excesso de embromação (embora também exista, é claro), de forma que esse não é um mercado para publicitários.

Especialistas do embuste, os publicitários precisam de veículos de comunicação do tipo antigo.

A Internet não é (ou ao menos não é na projeção futura) um espaço realmente propício à publicidade.

3. Um dos motivos pelos quais a publicidade-chantili sobrevive é a predominância dos veículos de comunicação estruturados como no século 20 — rádios, televisões, jornais, revistas. O financiamento desses veículos vem da publicidade e a publicidade se alimenta da existência desses veículos.

O século 20 acabou e o século 21 não vai terminar como o anterior. Acredito ser possível prever que a Internet e a consolidação das estruturas multi-canal (Internet-TV, principalmente) acabará por liquidar com a publicidade conforme a conhecemos (e com os jornais).

4. Como não têm qualquer espécie de compromisso com algum vestígio de verdade ou correção, os publicitários são os maiores promotores da esculhambação dos costumes. Por exemplo, o idioma.

Publicitários fazem pesquisas qualitativas com grupos de consumidores. Ao fazê-lo, observam que o consumidor médio brasileiro, por ser semi-analfabeto, tem dificuldade em compreender sentenças que incluam a justaposição de preposições com conjunções (por exemplo). Sua solução é reforçar a ignorância. No anúncio que produzem, em vez de dizer “a viagem com que você sonhou a vida inteira”, o locutor lasca “a viagem que você sonhou etc.”

O público, ao ser exposto a essa gramática tatibitate, aprende que a gramática é essa.

Decerto haverá professores de letras que dirão que isso é a “evolução da língua”. Isso. “evolução da língua rumo aos grunhidos das cavernas.

5. Retornando enfim ao início, o primeiro anúncio que gostaria de comentar é de um desses inacreditáveis sachês que se dependuram dentro da privada. Um sujeito que acabou de urinar chama a mulher: “Querida, precisa trocar o refil”.

Ato contínuo, aparece a mulher do indigitado, vestida num macacão antibiológico etc. etc.

Por se tratar de um anúncio escancaradamente porco-chovinista (por que raios o idiota não troca ele mesmo a porcaria do refil?), imaginei que ONGs de mulheres tivessem se insurgido contra ele (e outros, iguais).

Fui procurar na Internet e encontrei apenas duas (!!!) menções ao anúncio, uma delas descartável e a outra no Barrados no Eden.

Nenhuma reclamação de mulheres.

Betty Friedan, where are you?

6. O segundo anúncio é uma série do Banco do Brasil com locução do ator Antonio Abujamra.

Coisa mais estranha. Tudo é “du Brasiuuuuu”.

Nos anúncios, o Brasiiuuu é pujante, brigador, valente, e tal e qual — tudo propaganda do governo, é claro, além de boa parte ser mentira, pois se algo caracteriza o brasileiro é a subalternidade.

Resta a sensação de que aqueles anúncios poderiam ter sido produzidos pela Herbert Richers em 1947 ou 1972. Num caso, pelo anacronismo da voz. No outro, pelo ufanismo ao estilo general Medici.

7. Milhares de outros anúncios imbecis, ofensivos, ignorantes, de mau gosto e dotados de características deploráveis (são quase todos assim) poderiam ser mencionados, mas vou parando por aqui.

Bom dia.

Blog do Claudio Weber Abramo - Último Segundo iG

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Entre a cruz e a espada

Se um dia você já sonhou que poderia mudar o mundo com boas idéias, por favor leia esse texto. Se você nunca sonhou com isso, talvez a leitura lhe possa ser interessante.

Acho que todo publicitário passa por fases onde se questiona sobre a relevância social da própria profissão. A relevância existe, mas na maioria das vezes ela é negativa. O que vou falar agora não é comprovado por pesquisas, mas acredito que em 95% dos casos as marcas mais tiram das pessoas do que dão. A ideologia por trás da propaganda é vil e suja. E não me excluo dessa triste realidade. Muitas vezes já me peguei resolvendo "problemas de comunicação" que provavelmente geraram algum tipo de frustração ou lesão em pessoas de bem. Não porque eu sou mau, mas porque é assim que as coisas são. Na luta pela sobrevivência, é o nosso ganha-pão versus o do próximo. Pense bem. Você provavelmente já esteve na mesma situação.

Sempre fui um jovem preocupado com as questões sociais, um defensor de condições mais igualitárias e do respeito ao meio-ambiente. Mas o tempo foi passando e as coisas foram mudando. Há aproximadamente cinco anos, quando me mudei para São Paulo, acabei sendo envolvido pela roda viva do capitalismo selvagem. Não estou culpando a cidade, mesmo porque todas as outras querem ser iguais a São Paulo um dia. Culpo a mim mesmo por ter me deixado levar por suas promessas de fama e dinheiro.

Parece papo de esquerdista revoltado, mas nem politizado eu sou. Peço apenas mais um pouco de paciência, pois vou chegar ao ponto central desse post.

Interpreto esse conflito pelo qual passo (e já passei outras vezes) da seguinte maneira: ele significa que algumas atitudes que minha profissão me faz tomar negam alguns valores muito fortes em minha vida, e minha essência (ou seja lá o que for) teima em aceitar. Em ocasiões anteriores, engoli seco e segui em frente. Agora começo a perceber que não adianta fechar os olhos para o problema.

Mas como combater algo que está arraigado visceralmente em nossos job descriptions (puta merda, como odeio essa expressão!)?

Você estimula a compra de um carro mesmo o seu só dando problemas. Você estimula o uso de cartões de crédito e débito mesmo seu limite estando estourado. Você estimula o desejo de uma criança por um refrigerante mesmo tendo um filho que transborda ingenuidade. Você estimula a adesão a uma operadora mesmo sendo mal tratado sempre que precisa recorrer ao seu call center. Você estimula o consumo mesmo tendo consciência dos males que ele gera em nossa sociedade.

Quando eu digo você, também estou dizendo eu. Será que um dia nós vamos dar a isso a importância que deveriamos dar?

Não é de hoje que as marcas investem cada vez mais em marketing e menos em produtos e serviços. Mas vamos reclamar de que, não é mesmo? Isso garante nosso sustento. Por outro lado, prejudica milhares de pessoas como essas aqui, aqui e aqui (cliquem nesses links, é revoltante).

O pior é pensar que esse é o motivo pelo qual viramos noites e abdicamos de nossa qualidade de vida.

Toda essa reflexão foi bastante introspectiva, e me afastou do Promo Planners por um bom tempo. E hoje havia decidido abandonar o barco. Mas escrevo este post justamente para dizer que não vou mais fazer isso.

O fato é que cansei de escrever sobre o mercado. Essa metalinguagem do desprezível deixou de fazer sentido para mim. A cobertura do festival de Cannes sugou minhas últimas forças. Apesar de alguns seminários muito inspiradores, fui obrigado a conviver com a escória da propaganda mundial (e quando digo escória, me refiro aos egos de publicitários que pensam ser estrelas, mas cujo brilho não vai além de sua constelação - são eles que alimentam o lado negro da força).

Se é assim, por que não vou deixar de escrever no Promo Planners?

Porque infelizmente (ou felizmente) essa é a minha profissão. É o que eu sei fazer. Não pretendo me tornar um artesão e fixar residência em Trancoso. Provavelmente darei meu último suspiro na poluição intragável de São Paulo. Se tiver sorte, às margens do Rio Tietê. :)

Esse sorriso foi para mostrar que não estou revoltado. Mas já que estou coberto de merda até o pescoço (imagine se eu estivesse revoltado), vou tentar produzir adubo orgânico. Porque sei que se eu desistir, outro ocupará meu lugar. E talvez ele pertença ao lado negro da força.

A partir de hoje, utilizarei esse canal para escrever sobre o papel que nós, planejadores, podemos exercer para tentar construir um mundo melhor.

E não estou falando do lado Coca-Cola da vida. Refiro-me a ações que efetivamente agreguem algum valor relevante para a vida das pessoas com as quais tentamos nos comunicar. Com toda a humildade do mundo, tentarei inspirar atitudes que tornem nosso ofício um pouquinho menos deplorável.

Percebi que não posso gritar aos sete ventos que vivemos para produzir lixo atômico se não tentei fazer nada para mudar isso. Reclamar é fácil. Fazer não é tão fácil assim.

"Planning for good"? Não. Minha pretensão não é mudar o mundo (deixo essa para o Kuat). Ficarei feliz se conseguir trazer algum benefício real para a vida dos 30.000 homens/mulheres, AB, 18-34 anos, provavelmente residentes de São Paulo e Rio de Janeiro - doce ironia.

Por isso mesmo, passarei a destacar idéias que geram esse benefício, e a criticar de forma destrutiva idéias sem valor que nasceram de egos imbecis. Mais que isso, buscarei sempre que possível iniciar um diálogo produtivo com a finalidade de refletirmos sobre o poder que temos como estrategistas de marcas.

Sei que, no furor do dia-a-dia, posso acabar cedendo às exigências egoístas das grandes corporações (e até mesmo da agência, por que não?). Mas não farei isso sem lutar. E quando a recompensa chegar, mesmo ela sendo pequena aos olhos dos descrentes, comemorarei com a intensidade que a vitória dos valores humanos merece.

Talvez você não quisesse ler isso. Talvez você não merecesse ler isso. Talvez você não devesse ler isso. Mas agradeço a você por ter lido. E ficarei ainda mais grato caso você comece a aplicar seus valores de vida no seu dia-a-dia de trabalho.

Não somos nós que devemos nos adaptar ao ambiente corporativo. São as corporações que devem se adaptar ao nosso ambiente. Afinal, somos pessoas. E se formos fiéis a nossos valores, conseguiremos mais respeito para mais pessoas.